Sou de uma geração que beneficiou da praia, do campo e da
cidade a baixo custo e sem grandes pressões turísticas. Nesse tempo de antanho,
a glorificação da alegria de estar em grupos e em família era o mais importante
para nós. Para todos. Nada se fazia sem que houvesse um monte de primos,
amigos, ou de malta com os mesmos objectivos e empatia para o que quer que
fosse. Logo, as idas à praia eram uma festa, momentos de grande cumplicidade e
de criação de laços e relações, pois as redes sociais eram ainda um mero
raciocínio de ficção científica, ou quase.
Durante os meus quase 60 anos de vida e de praia, acompanhei
as modas e os desagrados ambientais relacionados com elas. Passei pela fase de
me proteger do sol, enfiado nas roupas, suando as estopinhas mas, estoicamente,
mantendo a brancura ariana durante meses, provocando a inveja nos góticos, que
despontavam por esses anos, ou tornando os pretos ainda mais escuros por
contraste. Passei pela fase do nudismo, na zona de Sintra, pois a Praia do Meco
tinha demasiadas dunas, e cansava imenso chegar até à água e à zona de acção,
ou melhor, de vislumbre dos matagais que por lá pululavam e da admirável mania
pela observação do topless. Passei pela fase do proteger a pele em demasia da
influência nefasta do Deus Rá. Portanto, um pouco ao sabor das vontades e do
seguidismo social.
Ao longo da minha vida de veraneante, sempre fui
relativamente fiel à Linha de Cascais. Pudera! A morar na Amadora, o comodismo
de banhos de sol, a baixo custo e o pouco dispêndio de tempo em deslocações a
isso favoreceram. Agora, que estou em Queluz, mantenho a mesma afirmação
anterior.
Com meses, de vida, era assíduo frequentador da Praia de
Santo Amaro de Oeiras, à qual anos depois voltei amiúde a utilizar, mais em
virtude da passagem para, e da, Piscina do Inatel, do que propriamente pela
mesma. Esta praia, aliás, foi onde no auge das colónias de férias para crianças
e jovens dos anos 60/70, passava secantes dias de Verão. Mais tarde, já casado
em novas núpcias e por estar a residir na Tapada das Mercês, Linha de Sintra,
onde sempre morei, tornei-me frequentador assíduo da Praia da Conceição, mesmo
no Centro de Cascais, não só pela praia em si, mas pelo ambiente cosmopolita e
pleno de pontos de restauração em redor.
No entanto a minha juventude, nos anos 80/90 foi passada na
Praia da Torre, onde o magote de amigos e conhecidos abancava, durante toda a
época estival, numa sequência inenarrável de disparates, namoricos e brincadeiras.
Era a época das baquetes do Celeiro, das colas e mines frescas, dos tijolos que
emitiam estridentemente sons de pop-rock que marcou a juventude dos putos de
então, avós e quase velhos de agora.
Depois, surgiu a vivência prolongada no Algarve, quase
sempre por motivos profissionais e com ele, a zona esplendida de Quarteira, de
Albufeira e do Carvoeiro, por onde me banhei durante inúmeros meses de calor.
Oscilando, entre a beleza das perigosas grutas e falésias que nos protegem do
sol, no Carvoeiro, e a beleza das esculturais fêmeas que se passeiam, aos
magotes semi-nuas ou semi-vestidas pelo Algarve rico, capitalista e
internacional de Albufeira.
Quarteira é local de passagem porque tem vida própria e
parecida com os quarteirões do nosso bairro citadino de Lisboa ou arredores.
Mais económica e familiar, Quarteira permitiu-me o mais longo período
consecutivo de usufruto de praia ao fim da tarde, depois do trabalho, pois
durante quase dois anos, o meu passatempo favorito era ir ler, beber algo ou
passear pela marginal da praia, entre os meses de Setembro e de Maio.
Excelente.
Do Norte, pouco falo porque das vezes que fui a zonas de
banhos, sempre me assustei com a bravura e frieza das águas, que contrastando,
ainda assim, com as da Zona de Sintra, me afastavam das delícias do remanso a
norte. No meio do país, duas zonas balneares frequentadas amiúde, praia da
Areia Branca e a Ericeira, esta última, não pelas águas mas pelo marisco e pela
calmaria emergente, mesmo em período de afluência elevada.
Quanto a Tróia, apenas estive por lá umas dezenas de vezes,
em especial, a meio da década de 80, e mais uns tempos na praia da Figueirinha
onde as águas a abarrotar de algas e com uma temperatura amena, nos idos 80/90
nos revelavam um Portugal assemelhado a alguns ilhéus helénicos.
Finalmente, nos arredores da zona Oeste, com a incontornável
Praia do Guincho, como prioridade. Foi nela que apanhei dos melhores bivalves
que me lembro. Na época, entre a Ericeira e o Guicho a opção era difícil,
estando relacionada com os pós noitadas. Dependendo do número de comparsas e
carros disponíveis, assim íamos para uma ou para outra, logo pela manhãzinha.
Como quase sempre o Ouriço, na Ericeira, estava a abarrotar e a discoteca, no
Lisandro tinha problemas de estacionamento, a opção era o Guincho.
Apesar de ter sido na Praia Grande que ia morrendo afogado,
em 1991, esta praia sempre foi uma das minhas eleitas quando precisava de me
isolar e reduzir o número de pessoas amigas ao redor. Tinha a vantagem de ter
uma bica com água fresca e saborosa, o ideal para quem fazia corridas de
manutenção, cross como se dizia na época.
Pouco mais recordo das inúmeras zonas balneares por onde
passei tempos, quer por cá, pelo meu querido Portugal de outrora, quer por
alguns sítios no estrangeiro. De entre estes recordo três por motivos díspares,
mas todos eles importantes.
Do Brasil, no Nordeste, nada me agradou, porque temos do
mesmo género de areais ao longo da Costa Vicentina. As praias têm é mais
garotas vistosas e descomprometidas, do que as nossas. De Espanha, retenho
Ibiza, mas de pouco me lembro, pois aquando da minha estada por lá, andei os
dias de permanência com uma ressaca que me tolheu as recordações. Sei por
fotografias e pelo relato dos amigos, que me acompanharam, que aquilo é, e foi,
uma loucura e foi de arromba, mas, sinceramente, prefiro Torremolinos,
Benidorme ou Salou, muito mais ao estilo tuga, pois, então.
A última recordação, essa sim, inolvidável, foi a
permanência na ilha do Príncipe, no arquipélago de São Tomé, no início da
década de 90, em companhia de um familiar, numa praia remota, com a água a
beijar os pés da cabana e com peixe e marisco fresco, bafejado com uma água a
vinte e poucos graus, o ideal para recuperar de uma profunda depressão. Fiquei
com São Tomé no coração.
Como conclusão, o referir o seguinte. O espaço e o local,
são aquilo que fazemos deles em função da companhia, do bem-estar e das
recordações que retemos. Apesar de tudo o que passei, bom e mau, não há nada de
mais agradável do que eu estar, nos calhaus e da Praia da Cruz Quebrada, que há
100 anos era inundada pela fina flor alfacinha, com um tempo instável, mas na
companhia da pessoa que amo.
Sempre que tenho um tempo para distrair, e partilhar em duo,
com a minha mulher, pimba… Carcavelos. A nossa praia, o nosso único local
estival que nos revela o que temos, ambos, para partilhar… amor, no pôr-do-sol,
numa esplanada com uma bebida fresca na mão juntos, lado a lado, olhando o
horizonte e deixando fluir o espírito e as ideias, e deixar o mundo, os
problemas e os outros, bem longe.
A praia favorita é aquela que nos marca e que nos deixa
feliz. Agora, no presente, para ambos é Carcavelos e parece que vai ser por
muitos anos, pois quanto mais velhos ficamos, menos aventuras e mais conforto.
Nada de confusões, improvisos, problemas. Apenas o deixar o lar e usufruir de
momentos de descontracção, sem stress, enquanto se está vivo e de saúde. Morrer
é a única certeza garantida que temos, só que é incerta, no tempo a sua ocorrência
Texto: Fernando de Sucena
Imagem: Google
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