Deixem-me ser político
Porquê não poderei ser tal?
Para o meu país amado,
Fiz menos bem do que mal
Mas ninguém foi enganado
Menti, enganei, o fisco e o Estado
Fui sempre o oposto no outro lado,
Como a outra malta bem onerosa
Que passa de Laranja a Rosa
Tenho perfil ideal para tal
Sujeito-me a ser sabujo
Passar por louco, anormal
Fazer merda, jogo sujo
Viver de cunhas e favores
Tratar quem odeio por amores
Desculpar erros grosseiros
Concordar com desordeiros
Deixem-me ser político
Porquê não poderei ser tal?
Para o meu país amado,
Fiz menos bem do que mal
Mas ninguém foi enganado
Antes, político era um sacrificado
Agora sacam tudo ao esmifrado
Defraudam, delapidam património
Junto com esforço, pelo António
A velha Constituição segue a fluir
E faz com que se tenha de mentir
Para ter milhares de assinaturas
E apresentarem-se candidaturas
Perpetuando a ampla corrupção
Que campeia de alto a baixo
Depois de ter um bom 'tacho'
Deixar a actividade não é mais opçáo
Deixem-me ser político
Porquê não poderei ser tal?
Para o meu país amado,
Fiz menos bem do que mal
Mas ninguém foi enganado
Com mais ou menos mama, conezia
Viverei feliz e escudado em alguém
Nesse mundo hipócrita de fantasia
A pagar favores e apoios também
Também com os curricula se engana
Sem que ninguém, afinal, vá de cana
Subsistir sem remorso com esquemas
Dá para ganhar posse em todos os sistemas
Com muito treino e afinco
De anos de experiência confirmada
Com a Justiça direi: Já brinco
Será tudo política e palhaçada
Deixem-me ser político
Porquê não poderei ser tal?
Para o meu país amado,
Fiz menos bem do que mal
Mas ninguém foi enganado
Enfim, por tudo o que foi dito
No fim de contas serei bendito
Só não entendo porque não...
Não posso ser político, então!?
Reúno competências variadas
Mestrados feitos às estaladas
Para desempenhar a profissão
Que não é a verdadeira paixão
Mas se disserem que eu disse
Nego, refuto, desminto, já se vê
A agir com tanta malandrice
Ganho com'os outros, com parvoíce
Deixem-me ser político
Porquê não poderei ser tal?
Para o meu país amado,
Fiz menos bem do que mal
Mas ninguém foi enganado
Tanto se faz que seja agricultura
Pesca, economia, finanças, cultura
Fazer tristes figurões não custa
E a asneira, o erro não me assusta
Com pessoas certas, só por azar
Poderei a Primeiro vir a chegar
Basta o meu aparelho partidário
Eleger-me como o melhor otário
Posso todos ultrapassar, ser egoísta
Para vacinas e tratos, não quero lista
Quero vénias, culto e respeito
Apesar de tudo e a despeito quero ser… eleito
Texto: Fernando de Sucena/2020
Imagem: Google