Nos idos e saudosos anos 60, do
outro século, o percurso escolar da canalha tinha a ver com o concluir a escola
básica. Seria bom, ir-se até ao final do básico (hoje) Escola Primária, 4ª
classe, e 2º ano do Ciclo Preparatório (antes). Com um bocado de esforço, e
motivação tirar o 5º ano (antes) ou 9º ano unificado (agora) e com muito
esforço, mas mesmo muito, dinheiro aplicação e com a ajuda de Deus, o Ensino
Superior ou a Universidade. Quem não gostasse de estudar muito poderia seguir o
Ensino Profissional. Mais tarde, isto foi rebaptizado em Via Ensino e Via
Profissional.
Bom, mas estas clarificações
poderão ser avaliadas consultando os milhares de páginas disponibilizadas pelo
Google. O que interessa nesta coisa é o ensino imediatamente ante e pós o golpe
de estado abrilista.
Quando se deu o malfadado golpe
de 25 de Abril estava aqui, o catraio, a semanas de terminar o 2º ano do Ciclo
Preparatório. Devido a esse acidente da História portuguesa, e como estava
aflito para transitar de ano, mas tinha uma média positiva, graças ao bom
desempenho em quatro disciplinas que sempre me agradaram (Ciências, História,
Desenho e Português) lá consegui, à rasquinha, passar mesmo sem aulas durante
uns dias – onde é que já vi isto? –.
Transitei de uns pavilhões
pré-fabricados verdes, frios e desconfortáveis que existiram em frente à
Academia Militar, na Amadora, (demolidos para dar origem aos prédios que lá
estão) para uns outros, na Venteira, ao lado do pavilhão desportivo do Bairro
do Janeiro. Sempre a mudar a sermos desestabilizados, já época marcelista.
Mal preparado e muito fechadinho
em termos sociais, a minha chegada ao Liceu (era assim que as escolas do
secundário se chamavam) foi um choque. Semelhante ao que acontece com esta
malta de agora. Quando, entram no secundário começa o massacre mental aos pais,
as mudanças comportamentais, a ansiedade a revolta da putalhada. Foi aqui que
tive a primeira turma mista e estraguei o tino, com tanta pita para conviver.
Um choque!...
Comigo não foi diferente, com a
diferença de que essa transição ocorreu numa época irrepetível e que alienou
toda a gente. Toda a sociedade. Todo o país. Foi a época dos saneamentos de
professores, das manifestações de estudantes por tudo e por nada, da escassez
de salas de aula, de livros, de professores, mas não de charros, de furos, de
baldas e sei lá que mais.
Dessa época guardo 5 anos para
concluir dois e com mau aproveitamento e comportamento. Tudo mudou com os 18
anos e a ida para o ensino nocturno, nos anos 80 e no Liceu de Queluz, onde
acabei o secundário, como Trabalhador-Estudante, excelente coisa que agora,
infelizmente, não existe mais e foi substituído por essas aberrações de EFA e
CRVCC. Sinceramente, deram cabo do país.
Nesses conturbados anos, em
especial 1974/1975 foi a época das cargas policiais contra o pessoal do MRPP
(onde abri os olhos em quase todos os sentidos), da UEC e duma JC bem
musculada. Das batalhas campais à pedrada no Liceu, dentro e fora com a
pontaria falha, atirávamos calhaus dos telhados dos antigos pavilhões
escolares, nós, o pessoal (maçaricos nestas mudanças) obedecíamos aos gabirus
maduros de 18 ou 19 anos que por lá andavam, se arrastavam e papavam as miúdas
todas. E malta, era de invadir comboios na Amadora para irmo-nos juntar às
manifestações que decorriam em Lisboa. Era um fartote. Tudo à pala e tudo a
berrar por coisas que já nem me lembro mas que cheiravam a esquerdistas. Tudo o
que servia para faltarmos às aulas, que não eram tão intensas como agora e nem
tínhamos tanta informação disponível como agora. As baldas mais fixes eram,
sobretudo às disciplinas de Moral e Religião, Educação Física e Educação
Musical.
Desse tempos em que os
professores, desgraçados, eram agredidos por não passarem alunos, pelos
próprios, saneados pelos directores das escolas, enxovalhados pelos pais dos
alunos que só faziam merda (muito pior do que a que estes imberbes imbecis
nomofóbicos fazem agora). Enfim, uma trapalhada monumental.
Desses magníficos e ímpares
tempos guardo a recordação de, na Amadora, tudo ser extremado. Embora sendo eu filho
de uma classe média-baixa trabalhadora, nunca fui integrado pelos betos
abonados, mas também não fui muito confrontado pelos pobretanas que invadiam as
escolas vindos das barracas da Brandoa e da Ribeira da Falagueira, perto de
onde eu morava, pelos ciganos que invadiam os recreios das escolas primárias
pelo menos na 1ª e na 2ª classe. Na primária os professores davam ponteirada,
reguadas às carradas e, alguns tabefes, cachaporradas no cachaço e, por vezes,
pontapés. Essa agressividade fez com o respeito a Deus, à Pátria e à Autoridade
fosse resistindo até aos dias de hoje e nos tornássemos os governantes da
actualidade, os protestantes do presente, os vigaristas de agora e os
inconformados resilientes do futuro imediato.
Se, isto não nos matou, se a
droga não nos destruiu a todos, então não vai ser o Covi-19 a derrubar esta
geração, que venceu a tuberculose, a fome, o racionamento e as filas, que
tomava óleo de fígado de bacalhau, vacinas às carradas, ia aos endireitas, às
mezinhas dos farmacêuticos, mas sobretudo ouvia os professores. Acabámos nisto
mas, leitores, até foram uns 55 ou 60 anos bem vividos. Lá isso, foram.
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| Liceu da Amadora 25/4/1975 |
Texto: Fernando de Sucena
Imagem: Google

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