Quase todos os portugueses, sem
excepção, já fizeram a sua vigarice. Antigamente, era eu miúdo, além de palmar
umas coisitas insignificantes, no recém-inaugurado e saudoso Pão-de-Açúcar, na
Venda-Nova, com os meus amigos, igualmente catraios, da praceta. Ultrapassava a
habilidade natural da canalha, para a trafulhice com 13/14 anos, então, com
coisitas inocentes à data de hoje. O meu limite vigarista era o de desbloquear
o cadeado telefónico que os pais colocavam, para impedirem de falarmos sem
limite com a malta. Não havia telemóveis e as linhas desactivadas dos TLP,
ainda estavam escondidas nas centrais telefónicas, em migração do
analógico/digital para a fibra-óptica. Minudências juvenis.
Também andar na penda no eléctrico ou à borlix
no comboio, não pode ser considerado grave, quando os par(a)lamentares andam em
classe executiva no avião e recebem subsídios por morarem em casas onde nunca,
sequer cagaram.
Até se chegar a ser um Berardo é
uma questão de ganância. Nunca ambicionei muito e por esse facto, quiçá, nunca
me perdi de amores com grandes furtos ou burlas. Limitei-me a estar sempre em
golpitos de merda, mas que eram moda, nas suas épocas respectivas. Umas
empresas fictícias, uns recibos verdes enganados, uns engates rentáveis a
senhoras respeitáveis, uns trocos tirados nos pratos das gorjetas dos cafés da
Baixa e das cabines telefónicas de moeda na Avenida da Liberdade…
Como se pode constatar, coisa
pouca, que sempre renderam dores de cabeça. Apenas lucrei processos criminais e
cíveis, multas, trabalho comunitário e pouco mais. Claro que nem às paredes
confesso, o modus operandis, os sócios, ou as técnicas, mas na década de 70
eram do mais inovador que imaginam. Tivesse eu tido mais disponibilidade ,para
conviver com alguns dos cromos da política da minha criação, e a história seria
outra. Sempre fui um pouco para o cobardolas e agradeço esse factor temerário
imposto pelos pais, para não andar hoje nas bocas do mundo, a ser apontado como
mais um filho da puta, a gamar à grande, o povito. Livra!
Ainda bem que, sou descendente de
famílias onde só de se pensar em desviar um simples ‘clip’, a fama desse
criminoso acto, era tatuada na personalidade. Uma das vantagens de se viver no
Estado Novo. Havia muito poucos a roubar e a prevaricar prejudicando a Nação.
Admiro no entanto, os golpistas
dos milhões. Daqueles que obrigam o Estado a pedir cada vez mais uns euritos a
mais, a todos os portugueses, para financiar buracos de biliões, nos bancos,
nos ministérios, nas PPPs etc. e tal. Temos que admirar a genialidade da burla
global e gigantesca que os verdadeiros mestres do desvario económico realizam,
sem que nos apercebamos de tal antes de ter sido efectuada a coisa. Gostava de
ter sido assim, mas prefiro, ser condenado às sevícias da justiça por ser
pobre, do que andar livre e com milhões pertencentes a outrem. Milhões aos
molhos, só os do euromilhões.
Texto:Fernando de Sucena
Imagem: Google

